'Abdu'l-Bahá: Respostas a Algumas Perguntas
Bahá´u´lláh (1) apareceu num tempo em que o
Império Persa estava imerso em profundo obscurantismo e ignorância, mergulhado
no mais cego fanatismo. Já deveis ter lido, nas histórias europeias, descrições
minuciosas dos costumes, ideias e moral dos persas nos últimos séculos.
Desnecessário é repeti-las. Diremos, simplesmente, que a Pérsia descera ao
ponto de causar lástima aos visitantes estrangeiros, ao verem este país tão
glorioso antigamente, cujo nível de civilização fora tão elevado, achar-se
agora em plena decadência, ruína e caos, vindo seu povo até a perder o sentido
de dignidade.
Foi quando Bahá´u´lláh se manifestou. Seu pai era
um vizir, e não um dos ulemás. Como todo o povo da Pérsia sabe, Ele nunca
estudara em colégio algum, nem se associara aos ulemás ou homens de erudição. A
primeira parte de Sua vida foi passada na maior felicidade. Seus companheiros
eram persas da mais alta posição, embora não fossem sábios.
Apenas Bahá´u´lláh soube da manifestação de Báb,
afirmou: “Este grande homem é o Senhor dos
retos; crer Nele é dever de todos”. E levantou-se em apoio ao Báb, dando
inúmeras provas e evidências positivas de Sua verdade, apesar de haverem os
ulemás da religião oficial constrangido o governo da Pérsia a mover-Lhe
oposição e, mais ainda, terem decretado, para aqueles que O seguiam, matança,
pilhagem, perseguição e expulsão. Em todas as províncias, começaram a matar,
incendiar, roubar os adeptos, e assaltar até as mulheres e crianças. Não
obstante tudo isso, Bahá´u´lláh ergue-se e proclamou a palavra do Báb
fervorosamente e com indomável firmeza. Nem por um momento se escondeu; não,
andava abertamente no meio de Seus inimigos. Ocupava-se em dar provas e
evidências, e era reconhecido como arauto da palavra de Deus. Sob várias
condições e circunstâncias suportou infortúnios extremos, e a cada momento
corria o risco de ser martirizado. Foi posto numa prisão subterrânea, em
correntes, sendo confiscada Sua herança e saqueadas Suas vastas propriedades.
Quatro vezes exilado de um lugar para outro, só encontrou descanso, afinal, na
“Maior Prisão”. (1)
A despeito de tudo isto, nem por um momento
sequer, deixou Bahá´u´lláh de proclamar a grandeza da Causa de Deus. Tais foram
Seus ensinamentos, Suas virtudes, Suas perfeições, que Ele se tornou objeto da
admiração de todo o povo da Pérsia. Em Teerã, Bagdá, Constantinopla, Romélia, e
até em ´Akká, todos os sábios e homens de ciência, quer amigos, quer inimigos,
quando admitidos à Sua presença, recebiam sempre, para qualquer pergunta que
Lhe tivessem feito, a resposta mais completa e persuasiva, vindo assim a
confessar, frequentemente, ser Ele único, incomparável, em todas as perfeições.
Acontecia muitas vezes reunirem-se em Bagdá certos
ulemás, rabinos e cristãos, com alguns sábios europeus. Nesses abençoados momentos,
cada um tinha alguma pergunta a propor, e todos, embora seus graus de cultura
fossem muito diversos, recebiam respostas adequadas e convincentes, podendo
então retirar-se satisfeitos. Até mesmo os ulemás persas de Karbala e Najaf
escolheram um sábio, de nome Mulla Hasan Amu, e Lhe mandaram em missão. Esse
emissário foi admitido à Santa Presença e apresentou as várias perguntas dos
ulemás, às quais Bahá´u´lláh respondeu. Então, Hasan Amu disse: “Os ulemás reconhecem, sem hesitação, e
confessam a sabedoria e a virtude de Bahá´u´lláh, e estão convencidos
unanimemente que em toda a erudição ele é único, sem igual; é evidente também
que nunca estudou, portanto não adquiriu essa erudição”; mas, ainda os
ulemás dizem: “Não estamos contentes com
isso; não admitimos a realidade de sua missão em virtude de sua sabedoria e
integridade. Pedimos-lhe, pois, que nos faça um milagre, a fim de satisfazer e tranquilizar
os nossos corações”.
Bahá´u´lláh respondeu: “Embora não tenhais direito de pedir isso, pois só a Deus compete
provar Suas criaturas, e não estas a Deus, admito, no entanto, e aceito esse
pedido. A Causa de Deus, porém, não é exibição teatral, apresentada de hora em
hora, da qual se possa esperar todos os dias um divertimento novo; se assim
fosse, tornar-se-ia mero brinquedo de crianças. Os ulemás devem, pois,
reunir-se e de comum acordo escolher um milagre, e escrever que, após a sua
realização, não mais terão dúvidas a Meu respeito, mas admitirão e confessarão
a verdade de Minha Causa. Selem o documento e tragam-no. Este deve ser o
critério aceito: realizado o milagre, não lhes restará dúvida; em caso
contrário, nós seremos acusados de impostura”. O sábio, Hasan Amu,
levantou-se e respondeu: “Nada mais há a
dizer”, beijou então o joelho do Abençoado, embora não fosse crente, e
partiu. Reuniu os ulemás e transmitiu-lhes a sagrada mensagem. Depois de se
consultarem, disseram: “Esse homem é
mágico; talvez faça mágica e assim nada mais teremos a dizer”, e agindo de
acordo com isto, não ousaram levar avante a questão. (1)
Hasan Amu falou dessa ocorrência em muitas
reuniões. Depois de deixar Karbala, foi a Kirmanshah e Teerã, e em toda parte
contou os pormenores, frisando sempre o medo e a retirada dos ulemás.
Numa palavra, todos os adversários de Bahá´u´lláh
no Oriente admitiam Sua grandeza, sublimidade, sabedoria e virtude, e, não
obstante serem Seus inimigos, sempre se referiam a Ele como “o famoso
Bahá´u´lláh”.
No tempo em que esta grande Luz se ergueu de
súbito no horizonte da Pérsia, o povo, os ministros, ulemás e membros das
outras classes levantaram-se contra Ele, perseguindo-O com a maior animosidade
e proclamando que esse homem queria eliminar e destruir a religião, a lei, a
nação e o império. Dizia-se o mesmo de Cristo. Bahá´u´lláh, entretanto, só, sem
apoio, resistiu a todos, jamais mostrando a mínima fraqueza. Finalmente
disseram: “Enquanto esse homem permanecer
na Pérsia, não haverá paz nem tranquilidade; devemos exilá-lo, a fim de que a
Pérsia possa voltar a um estado de sossego.”
Empregaram, pois violência para com Ele, a fim de
obrigá-lo a pedir permissão para sair da Pérsia, pensando que assim se
extinguiria a luz de Sua verdade; mas o resultado foi justamente o contrário. A
Causa tornou-se mais gloriosa; mais intensamente ardia sua chama. Difundira-se,
de início, pela Pérsia, somente, mas com o exílio de Bahá´u´lláh, atingiu
outros países. Mais tarde, Seus inimigos disseram: “Iraque Árabe (1) não é bastante longe da Pérsia; temos que mandá-lo
para um reino mais distante.” Assim o governo persa resolveu mandar
Bahá´u´lláh do Iraque para Constantinopla; mas, novamente, se verificou que a
Causa nem por isso se enfraquecia. Ainda outra vez os persas disseram: “Constantinopla é um lugar de passagem, de
morada temporária para várias raças e povos, entre os quais muitos persas”,
e exilaram-No, pois, para mais longe, para a Romélia. Ali se intensificou,
porém, o ardor de Sua chama; a Causa era enaltecida cada vez mais. Disseram os
persas afinal: “Nenhum desses lugares
está seguro contra sua influência; devemos exilá-lo para algum lugar em que
esteja completamente destituído de poder, e sua família e seus adeptos tenham
que se submeter às mais penosas aflições”. Escolheram, portanto, a prisão
de ´Akká, reservada especialmente para assassinos, ladrões e salteadores de
estrada – e foi, em verdade, entre tais criminosos que O classificaram.
O poder de Deus, entretanto, manifestou-se: Sua
palavra foi divulgada, e a grandeza de Bahá´u´lláh tornou-se evidente, pois foi
sob tais circunstâncias, enquanto nessa prisão, que Ele fez a Pérsia progredir
em conhecimentos. Venceu todos os inimigos, provou-lhes que não podiam resistir
à Causa. Seus santos ensinamentos penetraram todas as regiões; firmou-se a Sua
Causa.
Em toda a Pérsia, surgiram contra Ele os inimigos
cheios de ódio. Sujeitavam os adeptos ao açoite, à prisão, até à morte;
incendiavam e arrasavam milhares de moradas. Por todos os meios queriam
exterminar a Causa, esmagá-la completamente. Apesar de tudo isso, se bem que
fosse promulgada de uma prisão de assassinos, salteadores e ladrões, esta Causa
era enaltecida. Seus ensinamentos foram largamente disseminados: Suas
exortações atingiram até mesmo muitos daqueles mais cheios de ódio,
transformando-os em crentes fervorosos. O próprio governo da Pérsia despertou,
e arrependeu-se do que sucedera por culpa dos ulemás.
Com a vinda de Bahá´u´lláh a essa prisão na Terra
Santa, os sábios perceberam que a boa nova dada por Deus pela boca dos
Profetas, dois ou três mil anos antes, havia novamente se manifestado; Deus
fora fiel à sua promessa, pois a alguns dos Profetas revelara a boa nova de que
“O Senhor dos Exércitos se manifestaria
na Terra Santa”. Todas estas promessas se cumpriram e, não fossem as
perseguições infligidas pelos inimigos – não fosse Sua expulsão – difícil seria
ver como Bahá´u´lláh poderia ter deixado a Pérsia e levantado Sua tenda na
Terra Santa. Seus inimigos visaram com esse encarceramento à destruição total
da sagrada Causa, mas foi, na realidade, o maior benefício; tornou-se meio de
seu desenvolvimento. O renome da sublimidade de Bahá´u´lláh estendeu-se pelo
Oriente e pelo Ocidente; os raios do Sol da Verdade iluminaram o mundo inteiro.
Louvado seja Deus! Embora prisioneiro, ergueu tenda no Monte Carmelo e movia-se
livremente com a maior majestade. Cada um que vinha à Sua presença, fosse
amigo, fosse estranho, dizia: “Este é um
príncipe e não um cativo”.
Logo após a chegada a esse cárcere, dirigira
Bahá´u´lláh uma epístola a Napoleão, (1) enviando-a por intermédio do
embaixador francês. Seu conteúdo foi, em resumo: “Pergunta qual o nosso crime, e por que estamos encarcerados nesta
prisão, nesta masmorra”. Napoleão não respondeu. Foi-lhe enviada outra
epístola, a qual se encontra no Suratu´l-Haikal, (2) e na qual advertiu: “Ó Napoleão, por não haveres escutado a
minha proclamação, nem a ela respondido, perderás em breve teu domínio e
sofrerás destruição total.” Essa epístola foi enviada a Napoleão pelo
correio, graças ao cuidado de Cesar Ketafagoo (1) – fato este conhecido por
todos Seus companheiros de exílio. O texto desta advertência espalhou-se por
toda a Pérsia, porque nesse tempo divulgou na Pérsia o Kitábu´l-Haikal, no qual
estava incluído. Isso aconteceu em 1869. Como fizessem o Suratu´l-Haikal
circular na Pérsia e na Índia, e assim chegar às mãos de todos os crentes,
estes aguardavam com ansiedade os futuros acontecimentos. Logo depois, em 1870,
rebentou a guerra entre a Alemanha e a França, e embora ninguém esperasse
naquele tempo a vitória da Alemanha, Napoleão conheceu, afinal, a derrota e a
desonra, teve que render-se aos inimigos, e sua glória se transformou,
realmente, em profunda humilhação.
Foram enviadas epístolas a outros reis, entre os
quais Sua Majestade, Nasiru´d-Din Xá. Nesta epístola Bahá´u´lláh disse: “Mandai-me chamar, reuni os ulemás, e pedi
provas e argumentos, a fim de se saber o que é verdadeiro e o que é falso”.
Sua Majestade Nasiru´d-Din Xá enviou a sagrada epístola aos ulemás,
propondo-lhes que empreendessem a missão, mas não o ousaram fazer. Pediu então
a sete dos mais célebres entre eles que escrevessem uma resposta ao desafio.
Após algum tempo, devolveram a sagrada epístola, dizendo: “Esse homem opõe-se à religião e é inimigo do Xá”. Sua Majestade, o
Xá da Pérsia, muito aborrecido, disse: “Esta
questão exige provas e argumentos para demonstrar sua verdade ou sua falsidade;
que tem isso com inimizade ao governo? Ai! quanto respeitávamos esses ulemás,
mas nem podem responder a esta epístola!”
Em resumo, tudo o que estava escrito nas epístolas
aos reis está se cumprindo. Se conferirmos os acontecimentos desde o ano 1870,
verificaremos terem quase todos se realizados de acordo com as profecias;
restam apenas poucas, as quais mais tarde hão de se cumprir.
Assim, povos estrangeiros também, e várias seitas
que não acreditaram em Bahá´u´lláh, atribuíram-Lhe muitas coisas maravilhosas,
dizendo alguns que era santo. Outros escreveram acerca Dele, entre os quais
Sayyd Dawoudi, sábio sunita de Bagdá, que compôs um pequeno tratado no qual
relata alguns atos sobrenaturais. Há pessoas ainda, em toda parte do Oriente,
que O consideram santo e têm fé em Seus milagres, embora não O aceitam como
Manifestante Divino.
Tantos inimigos como adeptos, e todos aqueles
admitidos à Sua presença, reconheciam e atestavam a grandeza de Bahá´u´lláh
embora Nele não acreditassem, e logo que entravam neste santo lugar, tal era o
efeito de Sua presença, que quase todos se sentiam sem o poder de pronunciar
uma palavra. Quantas vezes acontecia um de seus acérrimos inimigos dizer de si
para si: “Direi tais e tais coisas ao chegar
à sua presença, disputarei e arguirei do seguinte modo”, mas quando ali
entrava, ficava atônito e confuso, até mesmo mudo.
Bahá´u´lláh, nunca estudara o árabe; não tivera
instrutor ou professor, nem frequentara escola; no entanto, a eloquência, o
estilo elevado, de Suas dissertações na língua árabe, como também Suas obras
escritas no mesmo idioma, causaram admiração, até espanto, aos sábios árabes de
mais renome, e todos reconheceram e declararam ser Ele incomparável e sem
igual.
Se examinarmos cuidadosamente o texto da Bíblia,
veremos que o Manifestante Divino jamais disse aos que O negavam: “Seja qual for o milagre que desejardes,
estarei pronto para realizá-lo, e submeter-me-ei a qualquer prova que
propuserdes.” Na epístola ao Xá, porém, Bahá´u´lláh disse claramente: “Reuni os ulemás e mandai-me chamar, para
que as provas e evidências possam ser estabelecidas.” (1)
Com a firmeza de uma montanha, Bahá´u´lláh
enfrentou os inimigos durante cinquenta anos. Todos desejavam destruí-Lo; mil
vezes planejaram crucificá-Lo. Durante cinquenta anos esteve Ele em constante
perigo.
Tal é o grau de decadência e ruína da Pérsia hoje,
que todas as pessoas inteligentes, sejam persas, ou estrangeiras, compreendendo
a verdadeira situação do país, reconhecem que o progresso, a cultura e a
reforma dependem da adoção dos ensinamentos desta grande personagem, e do
desenvolvimento de Suas teorias.
Cristo, em Seu tempo abençoado, educou realmente
apenas onze homens, dos quais o maior era Pedro, se bem que este, ao ser
interrogado, O negasse três vezes. Não obstante isso, a Causa de Cristo
penetrou, em seguida, o mundo inteiro. Em nosso tempo, Bahá´u´lláh educou
milhares de almas, as quais, sob a ameaça da espada, erguiam aos céus o grito
de “Yá Bahá´u´l-Abhá” (1) e no fogo das provações suas faces reluziam como
ouro. Reflitamos, pois, no que há de suceder no futuro.
Enfim, devemos ser justos e reconhecer o grande
educador que foi esse Ente Glorioso; devemos verificar os maravilhosos sinais
por Ele manifestados, e admitir que, em todo o mundo, Dele emanaram forças e
poder inegáveis.
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