Por
Guilherme Bitencourt
Em várias páginas, tem-se noticiado sobre um
fenômeno que, nesta pandemia, está ganhando mais visibilidade devido ao elevado
número de pacientes que estão com COVID-19 e parecem apresentar uma melhora no
quadro clínico antes de morrer, como se essa 'melhora' fosse apenas para dar um
adeus.
Médicos, jornalistas e familiares de pacientes com
COVID relataram ter presenciado esse fenômeno. Um exemplo foi o caso do ator
Paulo Gustavo, que chegou a ser extubado, interagiu com a equipe médica, seus
entes queridos e, dois dias após apresentar uma 'melhora', veio a óbito.
O fenômeno que vem sendo observado com mais
atenção ultimamente não é algo novo ou desconhecido, e existe um longo registro
que remonta à antiguidade.
Mesmo Hipócrates, que nasceu 4 séculos antes de
Cristo e é considerado o pai da medicina, já havia observado esse fenômeno, que
até então a ciência não tem uma explicação definitiva.
Diversas culturas ao redor do mundo, incluindo a
grega antiga, sempre acreditaram que a alma permanece intacta, enquanto o
cérebro é afetado pelo desgaste do estado físico, causando distúrbios mentais.
O biólogo alemão Michael Nahm explica esse
fenômeno, admitindo que "a mente
humana seria mais do que um mero produto da fisiologia do cérebro".
Talvez envolva até mesmo um tipo de 'sujeito transcendental' ou 'vida interior
oculta'. Ele cunhou o termo 'lucidez terminal' para o fenômeno, recolhendo
vários relatos históricos ao longo de centenas de anos em diversas culturas.
Existem também hipóteses, como a de Fernandes, do
Hospital das Clínicas da USP, que busca uma explicação nos moldes científicos.
Ele diz que o corpo emite uma descarga de hormônios de estresse (adrenalina)
junto com outras substâncias, assim que percebe que está próximo da morte,
devido ao instinto de preservação, que busca ainda 'lutar' ou 'fugir' do
inevitável.
De acordo com Fernandes, isso traz uma 'melhora' momentânea, como aumento da frequência cardíaca e pressão arterial, fazendo com que os órgãos que estão provavelmente danificados, como o sistema neurológico, funcionem melhor, levando o paciente à lucidez por um breve momento.
Stafford Betty, professor de Estudos Religiosos da
Universidade do Estado da Califórnia, diz que a questão passa pelo que alguns
chamam de alma.
"Pense em uma mulher que perdeu
toda a sua capacidade de se comunicar com outras pessoas e, por alguma estranha
razão, pouco antes de morrer, ela irrompe em sua antiga personalidade, com seu
cérebro totalmente destruído, e consegue de repente conversar com pessoas
amadas. A razão de esses momentos de lucidez aparecerem é que a consciência do
ser (que alguns chamam de alma) conseguiu se desvencilhar do cérebro e
funcionar independentemente do sistema nervoso."
Isso me fez lembrar anos atrás, quando li em um
artigo uma citação que gravei do psicólogo estadunidense Michael Shermer. Ele
afirma que, de fato, toda a experiência dos denominados fenômenos paranormais,
como fora das experiências do corpo, nada mais são além de eventos neuronais
mediados e produzidos pelo cérebro. Porém, estudos de pacientes com EQM
(experiência de quase morte) acabam revelando que a consciência, com memórias,
cognição, emoções, identidade pessoal e percepção para fora e acima do corpo sem
vida, é vivida durante um período de um cérebro não funcional (pancerebral
transitória anoxia). Ele admite que não há nenhum problema em dizer que
"não sabe", e concordo com ele nesse sentido. Entretanto, diz
"até que uma explicação natural se apresente".
O mesmo acontece com os mecanicistas, que ao
contrário dos vitalistas, consideram a mente produto do próprio corpo, mas isso
é um equívoco. O cérebro é uma parte do corpo, mas mente e cérebro não são
iguais. O cérebro é como um pulmão que respira ar, e o ar é como a mente
humana.
Assim como o EQM, a lucidez terminal é um campo
que transcende o conhecimento do ser humano, onde alguns aceitam recorrendo à
fé, enquanto outros negam, afirmando ser produto da mente.
Baha'u'lláh lança luz sobre o corpo e a alma, nos
fazendo refletir sobre esses fenômenos tão próximos e complexos.
"Deves saber que a alma do homem
transcende e é independente de todas as enfermidades de corpo ou mente. O fato
de uma pessoa doente mostrar sinais de fraqueza é devido aos empecilhos que se
interpõem entre sua alma e seu corpo, pois a própria alma se conserva isenta de
qualquer mal corpóreo. Considera a luz da lâmpada: embora um objeto externo lhe
possa interferir na irradiação, a própria luz continua a brilhar sem diminuição
em sua intensidade. Do mesmo modo, toda moléstia que aflige o corpo do homem é um
empecilho que torna impossível à alma a manifestação de seu poder e força
inerente. Ao abandonar o corpo, porém, a alma mostrará tal ascendência e
revelará tão grande influência que nenhuma força na terra a pode igualar. Toda
alma pura, aperfeiçoada e santificada será dotada de poder tremendo e
regozijar-se-á, em pleno contentamento."
— Revelação Baha'í, vol.1, pág.46
Baha'u'lláh confirma a perspectiva dos antigos
gregos sobre a alma não ser afetada pelo corpo moribundo. Será que esse
fenômeno, agora chamado de "lucidez terminal", presenciado por
milhares de pessoas ao redor do mundo, é apenas um fenômeno da mente humana?
Não poderia a lucidez terminal ser um estado
experimentado pelo paciente em fase terminal, uma prova da existência da alma,
tal como as religiões têm afirmado por milhares de anos?
A lucidez terminal, assim como o fenômeno EQM,
pode estar relacionada mais à alma do que ao corpo, devido ao último estar
comprometido. Sendo assim, conforme o corpo deixa de ser necessário e começa a
se desintegrar, estando sujeito às ordens do mundo material, a alma vai
ascendendo ao plano espiritual sem sofrer nenhuma alteração infligida pelo
plano físico.
A mente, então, seria fruto da inteligência
superior e não produto do nosso cérebro, como dizem os céticos. Está
relacionada diretamente com a alma humana, que, diferente da crença popular,
não se encontra dentro do nosso corpo.
Refletindo acerca de toda a magnitude desse tema
relacionado a EQM e lucidez terminal, vêm-me as seguintes palavras Reveladas
por Baha'u'lláh, e vejo o quão profundos são esses assuntos e como ainda temos
muito a evoluir diante de tantas limitações e erros cometidos por nós, humanos,
sobre a alma:
"Em verdade digo, a alma humana
é, em sua essência, um dos sinais de Deus, um mistério entre Seus mistérios. É
um dos poderosos sinais do Todo-Poderoso, o arauto que proclama a realidade de
todos os mundos de Deus. Em seu âmago se oculta aquilo que o mundo está agora
inteiramente incapaz de apreender."
— Baha'u'lláh, Revelação de Baha'í,
pág.40
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